Especialista em Comportamento, Fabiana Guntovitch vê a violência contra a mulher como reflexo de uma educação machista,
As heranças machistas, que habitam o inconsciente coletivo, promovem, inadvertidamente, a cultura do estupro. Por décadas, desde a infância, meninas são educadas para agradar, e para dizer “sim”.
Essas são perguntas importantes: Por que nossos “nãos” valem menos que os dos homens? Será que é porque eles têm a voz mais grossa e potente que a nossa? Será que por trás de um “não” forte masculino existe uma ameaça implícita de agressão física e por trás de um “não” feminino existe apenas uma apelação?
Gostaria que cada um de nós refletisse sobre essas perguntas, lembrando que encontraremos singularidades, subjetividades e, portanto, diferentes percepções do mundo e da sociedade, dependendo, claro, da sua experiência pessoal diante do tema. No entanto, para trazer este tema ao debate, peço licença para generalizar, observando uma linha histórica social que nasce no patriarcado e nos mobiliza interna e externamente em algum nível até hoje.
Quando escuto o Arnold Schwarzenegger dizer "Nunca aceite um não como resposta”, eu arrepio. Ainda que tenha sido dita num contexto profissional, esta frase é repetida, aclamada e internalizada na sociedade como sinônimo de força e de sucesso.
Nossos meninos sempre foram criados para resistir aos “nãos”. Sempre tiveram mais condescendência à rebeldia, sempre foram estimulados a insistirem e a conquistarem ainda que contrariados aos seus desejos e seus lugares no mundo. Já as meninas, no patriarcado, são educadas a não gritarem, a não se rebelarem, a dizerem “sim”, a serem pacíficas e complacentes. Essa mistura não poderia ser mais fatal.
Meninos foram criados e estimulados a romper barreiras, a usar a força física sempre que necessário e, especialmente, a exercitar sua sexualidade heterotípica. Por outro lado, no inconsciente coletivo, meninas foram criadas para serem complacentes, para dizerem “sim”, para agradar, para dar suporte enquanto os homens conquistavam seus espaços.
Quanto aos “sins” e aos “nãos”, no que diz respeito ao encontro entre meninos e meninas, houve um condicionamento coletivo que desempodera o “não”feminino estruturalmente. Meninas foram orientadas a dizerem “não” aos meninos em nome da sua imagem.
Meninas precisavam se fazer de difíceis para não parecerem fáceis e ficarem com fama. Meninas diziam “não” quando não queriam, e também diziam “não” quando queriam algo com um rapaz. O que isso os ensinou? A insistir, forçar a barra! Afinal, eles não tinham como saber quando o “não” era realmente “não”, ou quando o “não” era um “sim” amedrontado, disfarçado de “não”.
Esse foi o maior e pior desserviço que a educação machista trouxe à sociedade e sua maior contribuição à cultura do estupro. A leitura passou a ser tão subjetiva, que o masculino passou a se orientar quanto a vestimenta, ao comportamento e a liberdade do feminino como indicação de uma abertura e a ignorar o que é mais óbvio e simples: o “não” falado, independentemente de intonação ou volume. “Não” deixou de ser “não” na compreensão masculina quando dito pelas mulheres e nós, como sociedade, estamos lutando pela psicoeducação e pelo fortalecimento dos nossos “nãos”.
Hoje em dia temos a liberdade de sermos quem desejarmos ser e de viver nossa sexualidade como desejamos. Nós, sejamos meninas ou mulheres, não precisamos mais nos fazer de difícil. Portanto acreditem quando dissermos “NÃO”! “Não” é “não”. “Para” é “para”! Não insistam!
Quando um coach na mídia social te disser para jamais aceitar um “não” como resposta, ele não falou para forçar a barra. A ideia é que, se você deseja algo e escutar um “não”, que você procure outra pessoa ou outro lugar ao invés de ignorar o “não” que você acabou de escutar e insistir. Você não será um fraco se respeitar uma garota, nem será o garanhão se ficar com ela a qualquer custo. Pelo contrário. Você só será …
0 Comentários