Por que você não guarda dinheiro? Bom, existem várias respostas para isso. Talvez suas despesas essenciais sejam mais altas do que sua renda. Esse é o caso de muita gente no Brasil. Enquanto a renda familiar per capita está abaixo dos R$ 1.500, um estudo do Dieese diz que o salário mínimo para sustentar uma família de dois adultos e duas crianças deveria ser de quase R$ 5.000.


Mas a dificuldade de guardar não é exclusividade de quem não tem dinheiro suficiente. 
Segundo o SPC Brasil, 76% das pessoas terminam o mês zeradas ou no vermelho. Existem vários motivos para isso, como a falta de educação financeira e a desigualdade social. Mas, segundo a ciência, há ainda um outro mais subjetivo: a dificuldade do nosso cérebro de nos imaginar no futuro

Como assim? Em linhas gerais, o nosso cérebro é condicionado a pensar em nós mesmos no presente. O seu "eu" do futuro é como uma pessoa diferente. E, segundo, um estudo da American Psychological Association, isso faz toda a diferença.

Ao guardar dinheiro, você está pensando no futuro. São os planos do eu futuro que serão realizados, é a velhice do eu futuro que será garantida. Mas se o seu cérebro enxerga essa pessoa como alguém separado de você, fica mais difícil de se dedicar a essa tarefa.


Onde entra o idioma? 
Quem fala sobre isso é o economista comportamental sino-americano Dr. Keith Chen. De acordo com ele, falantes de um idioma que usa a mesma conjugação verbal para frases no futuro e no presente tendem a economizar mais – é o caso dos chineses e dos alemães, por exemplo. Como eles falam sobre o presente e o futuro da mesma forma, o cérebro é "treinado" a pensar sobre ambos com o mesmo grau de importância.

O português é diferente. Assim como o francês e o espanhol, entre vários outros. Nós usamos tempos verbais diferentes para nos referirmos ao presente e ao futuro. De acordo com o Dr. Chen, pessoas que têm o idioma nativo com essas características apresentam mais dificuldade para poupar, uma vez que presente e futuro parecem duas coisas totalmente separadas.

Em outras palavras: um dos fatores que dificultam guardar dinheiro é que valorizamos o presente em detrimento do futuro. É como aquela vozinha no fundo da cabeça dizendo “por que guardar se você não sabe o que vai acontecer amanhã?”.

Outras pesquisas já se debruçaram sobre isso. O psicólogo americano Hal Ersner-Hershfield confirmou essa teoria por um outro ângulo. Em seu estudo, imagens do cérebro mostraram que, quando alguém pensa em si mesmo, determinada região da mente se ativa. Em contrapartida, quando a pessoa pensa em si mesma no futuro, essa mesma região do cérebro deixa de agir – como se ela estivesse pensando em outra pessoa

Então brasileiros são naturalmente maus poupadores? De forma alguma. O idioma é um dos fatores que podem influenciar a forma como a gente percebe o presente e o futuro, mas não é o único elemento em jogo na hora de organizar as finanças e guardar dinheiro.

Como "hackear" o cérebro?


Sim, a gente também pode usar a ciência a nosso favor para aprender a economizar mais.
 O campo da economia comportamental, que estuda a forma como seres humanos fazem escolhas, apresenta uma série de estratégias que ajudam a nos treinar a tomar decisões financeiras melhores. Você pode encontrar várias delas no livro A Psicologia do Dinheiro, de Dan Ariely, e no TED Talk de Wendy de la Rosa, ambos expoentes da economia comportamental.

1. Pense no custo de oportunidade. Quando você faz uma escolha, invariavelmente está abrindo mão de outra coisa. Nas ciências econômicas, isso é chamado de “custo de oportunidade“. Se uma pessoa compra um celular, por exemplo, está gastando um dinheiro que poderia ser investido numa viagem.

Como não cair? Antes de comprar qualquer coisa, se pergunte sempre: “do que estou abrindo mão para fazer essa compra?”. Se for algo importante, talvez seja melhor repensar esse gasto. De qualquer forma, essa é uma maneira de parar e pensar se a despesa vale a pena e, dependendo do caso, evitar uma compra por impulso.

2. Fique de olho no poder da comparação. Você vai a um restaurante e o primeiro prato do cardápio custa R$ 50. Os itens seguintes variam na faixa dos R$ 30 e R$ 40. Pode parecer por acaso, mas, muitas vezes, não é. O primeiro preço que você vê estabelece uma base referencial. A partir daí, seu cérebro começa a fazer comparações em relação a esta base. Tudo nesse restaurante vai parecer barato uma vez que você estabeleceu os R$ 50 como base.

Como não cair? Estabelecendo tetos de gastos. De acordo com Ariely, somos captados por essa tática porque tendemos a gastar mais quando não temos uma noção de quanto vale o que estamos comprando. Quando for comer fora de casa, estipule uma quantia máxima que pode gastar. Para comprar algum produto, pesquise bem quanto ele vale e não se permita pagar mais.

3. Aproveite momentos de transição. Existe um conceito na psicologia chamado “fresh start effect” – em tradução livre, "efeito do novo começo". Basicamente, ele explica como momentos de transição, ou inícios de novos ciclos, nos tornam mais propensos a ir atrás dos nossos objetivos.

Como aproveitar? Existem vários inícios de ciclo na nossa vida. Pode ser um aniversário, o nascimento de um novo membro da família, uma mudança de emprego... Identifique esses períodos na sua vida e tire proveito deles. Se o seu aniversário é daqui a alguns meses, por exemplo, você pode estabelecer uma meta para economizar uma certa quantia até lá. Coloque lembretes regulares (quinzenais, por exemplo) no seu celular para ir se cobrando no meio do caminho.

E, falando em inícios de ciclo, o Ano Novo vem aí. Que tal aproveitar esse momento de transição e começar a botar essas estratégias em 
 prática?